Contrabando deixa rastro de mazelas sociais e econômicas
O crime de contrabando produz altos índices de criminalidade, eleva a informalidade, reduz a arrecadação de tributos públicos, gera concorrência desleal com o comércio formal e prejudica o turismo. Esses são os principais prejuízos causados pelo mercado ilegal de mercadorias, identificados pelo estudo A Lógica Econômica do Contrabando, realizado pelo IDESF (Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteira).
O levantamento foi consolidado a partir de informações, pesquisas e dados recolhidos e analisados pelos técnicos do IDESF, com base em vários estudos que tratam da dinâmica do contrabando nas fronteiras brasileiras. Ao longo de 11 estados, o Brasil possui 16.800 quilômetros de fronteiras com dez países. De acordo com o instituto, embora existam muitos pontos em comum, há problemas que são próprios de cada região.
Conforme o presidente do IDESF, Luciano Barros, na fronteira trinacional da Argentina, Brasil e Paraguai, os principais problemas residem no tráfico de drogas, contrabando e crescente tráfico de armas. Ele explica que esses crimes incidem na região de Foz do Iguaçu e estão fortemente presentes na área que vai do Rio Grande do Sul ao Mato Grosso, eixo geográfico em que o contrabando é mais incidente.
No estudo, o IDESF aponta que os índices de criminalidade, violência, desemprego e evasão escolar são mais elevados nas regiões de fronteira do que no restante do país. “Os malefícios sociais e econômicos do contrabando têm se demonstrado maiores que o próprio crime. Isso deve-se ao fato de haver uma grande parcela da população fronteiriça que trabalha no submundo do contrabando”, reflete Luciano Barros.
Caos social
O primeiro dado demonstrado pelo estudo aponta ser muito maior a taxa de homicídios nas cidades de fronteira, em relação à média nacional, que é de 29,05 assassinatos para cada grupo de cem mil habitantes. Em Foz do Iguaçu, esse índice é de 43,65 homicídios em cem mil habitantes; em Guaíra (PR) é de 68,34; e em Coronel Sapucaia (MS) chega ao perturbador patamar de 95,84.
A evasão escolar nas cidades fronteiriças também é muito elevada, aferiu a pesquisa A Lógica Econômica do Contrabando. Em Foz do Iguaçu, o índice de pessoas que abandonam os estudos é de 1,7% no ensino fundamental e de 8% no nível médio. Em Coronel Sapucaia (MS), a evasão é de 3,8% e 6%; e em Guaíra é de 1,1% e 6,2% nos ensinos fundamental e médio, respectivamente.
“Entre as principais análises que podemos fazer do estudo do IDESF é que para existir desenvolvimento socioeconômico nas áreas de fronteira precisamos pensar em educação. O contrabando é um atrativo para que os jovens troquem a escola pelo crime”, enfatiza Luciano Barros. “Não vamos conseguir construir especialistas para operar as mudanças necessárias sem políticas públicas contundentes na área da educação”, aponta.
Ataque à economia
O presidente do IDESF afirma que o contrabando afeta e desvirtua a economia como um todo. A atividade ilegal prejudica o comércio formal, pois a empresa afetada pelo contrabando é obrigada a despedir pessoas, e ainda diminui a arrecadação tributária nas cidades, nos estados e no país. “Também inviabiliza a expansão dos mercados e fomenta o aumento nos custos das empresas, desestimulando novos investimentos”, diz Barros.
Em seu estudo, o instituto aponta que 90% dos carros apreendidos com contrabando eram roubados e foram usados anteriormente em outros crimes. Desde 2012, a Receita Federal em Foz do Iguaçu recuperou 713 veículos com ocorrência de furto/roubo, que estavam sendo utilizados no transporte de mercadorias descaminhadas ou contrabandeadas, o que implica perdas econômicas e aumento da violência.
Menos tributos, menos contrabando
De acordo com Luciano Barros, os governos devem passar a considerar a relação direta entre o contrabando e os tributos. Para ele, ao reduzir a oneração tributária de determinados produtos, em uma lógica de combate, a arrecadação sobe e o mercado tende a formalizar-se. “Todos os produtos que são alvos do contrabando possuem uma carga tributária mais alta, a exemplo de bebidas, telefonia, cigarros e outros”, pondera.
O presidente do IDESF cita os casos da informática e do cigarro, analisados no estudo do instituto. O contrabando de produtos e suprimentos do setor de informática diminuiu em função da redução da alíquota tributária. Entre 2005 e 2006, as apreensões caíram de dez milhões para três milhões de computadores, ao passo que a produção nacional desses equipamentos saltou de três para 13 milhões de unidades no mesmo período.
Já o cigarro, que sofreu aumento da carga de tributos, apresentou crescimento no contrabando. Cerca de 70% do preço do cigarro brasileiro é decorrente de tributos e impostos. O levantamento do IDESF mostra que se o Brasil eliminar completamente o contrabando do produto, a arrecadação total de impostos pode saltar de R$ 12,9 bilhões para R$ 16 bilhões.
Investir em educação e nas demais políticas públicas é fundamental para o combate ao contrabando, conclui Luciano Barros. “Devemos olhar para a raiz dos problemas e saber que o contrabando nas fronteiras é fruto de uma equivocada política tributária, que taxa demasiadamente os produtos e cria oportunidade para o crime”, propõe. “Uma fronteira livre crimes fará o Brasil seguro e com todas as possibilidades para o desenvolvimento”, conclui.
O contrabando em números
– Em 2016 foram 18.600 inquéritos de contrabando.
– Segundo o Sinpef-MG (Sindicato dos Policiais Federais no Estado de Minas Gerais), o custo médio de um inquérito policial é de R$ 51 mil.
– 62 é o número de operações da Polícia Federal contra o contrabando de cigarros entre 2008 e 2017.
– Em 25 das operações, a Polícia Federal recuperou R$ 181 milhões em dinheiro e ativos.
– 90% dos carros pegos com cigarros contrabandeados eram roubados.
– 65% das marcas de cigarros contrabandeados possuem elevadas concentrações de elementos tóxicos.
– 81,2% das marcas de cigarro possuem fungos, fragmentos de insetos, gramínea ou ácaros.
– 100% das marcas não seguem regulamentação fitossanitária.